São “encomendas”, disse Cavaco

Em entrevista à  Rádio Renascença, questinado pela jornalista Raquel Abecassis sobre os “casos que marcaram esta campanha – BPN e casa de férias na Quinta da Coelha” – Cavaco Silva afirmou que estes “foram alimentados pela comunicação social e por jornalistas que receberam «encomendas» das candidaturas adversárias”. “Os jornalistas sabem quem é que montou a operação”, afirmou Cavaco Silva, desafiando os jornalistas a dizerem quem é que fez as encomendas.

foto Jornal de Negócios

 

As palavras de Cavaco Silva contêm uma grave acusação aos jornalistas a que a directora do Público, Bárbara Reis, questionada pela RTP1 (link indisponível), reagiu negando receber “encomendas” e trazem inevitavelmente à memória, o caso das chamadas “escutas a Belém”. Pode perguntar-se se as palavras de Cavaco significam que ele está à espera, à semelhança do que sucedeu no caso das “escutas” – com  a divulgação feita pelo Dário de Notícias de um e-mail do editor do Público para o correspondente do jornal na R.A. da Madeira, contendo precisamente uma “encomenda” de um assessor do Presidente sobre as “escutas a Belém” – que algum jornal revele agora a origem das, por si alegadas, “encomendas” dos casos BPN e da sua casa de férias.

A entrevistadora  não questionou o Presidente-candidato sobre a grave acusação que proferiu, a qual à falta da identificação clara dos destinatários se dirige a todos os que publicaram as notícias sobre o BPN e a sua casa de férias, embora lhe tivesse pedido que identificasse os autores da “encomenda”. Funcionou aqui  a atitude “reverencial” que caracteriza o relacionamento dos jornalistas  com o Presidente da República (seja ele quem for) e que não se encontra, por exemplo, na relação com o chefe do Governo. Basta lembrar as reacções indignadas de jornalistas e comentadores e as queixas judiciais de Moniz e Moura Guedes contra José Sócrates quando este criticou o Jornal Nacional de Sexta da TVI, chamando-lhe”Jornal travestido”. (Neste caso, porém, a acusação era directa e concreta).

Desconstruíndo as palavras do Presidente-candidato à Rádio Renascença, temos que um jornalista que recebe “encomendas” é um jornalista que se deixa instrumentalizar e manipular por quem lhe faz a “encomenda”.  Coisa diferente é um jornalista possuir  fontes que lhe fornecem “pistas”, documentos ou  outro tipo de informações e a partir daí fazer o seu trabalho. É, aliás, quase sempre assim que nascem os “escândalos” políticos. Mas a partir do momento em que um jornalista aceita uma pista (que é diferente de uma “encomenda”) e a toma como boa dando-lhe seguimento, assume-a como sua sendo responsável pelo destino que lhe dá. 

As palavras do Presidente-candidato, ao contrário do que possívelmente pretendeu, não atingem “as candidaturas adversárias” por ele implicitamente apontadas como autoras da “encomenda”. Atingem, sim, e em cheio, os jornalistas.  

Ora, seria muito mau para a democracia que a campanha eleitoral viesse arrastar também os jornalistas e o jornalismo no descrédito (de que muitos andam a falar) da política e dos políticos.

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