A pobreza das páginas de média dos nossos jornais

Folhear as páginas de média dos jornais (daqueles que as têm) constitui  quase sempre  uma frustração. De facto, os temas que predominam nessas páginas são as vidas, mais ou menos privadas, das chamadas “vedetas” da televisão ou dos que, não tendo embora aquele estatuto, protagonizam episódios – em geral fait-divers – que os tornam momentâneamente merecedores de figurar nessas páginas.

Tomando o dia de hoje como exemplo temos, no Correio da Manhã, a “notícia” da “paixão” do ex-deputado Agostinho Branquinho (agora membro da Ongoing) por “uma brasileira”, completada  com pormenores da sua vida privada e profissional. No Diário de Notícias,  são os momentos de riso dos pivots de televisão a preencher quase todo o espaço dedicado aos média. Temas profundos, como se vê.

Esta constatação dá razão à crítica feita aqui de que os jornalistas não gostam de discutir a sua profissão. Não  sabemos se  isso se deve a não serem capazes de se questionar ou se pensam que não há nada a discutir sobre o exercício  do jornalismo.  

Acontece, porém, que o jornalismo merece e deve ser discutido e, como referi aqui, está a sê-lo, porém, em fóruns que os jornalistas e outros profissionais dos média não têm interesse em frequentar.  Dir-se-ia que só lhes interessa a substância de outras funções e profissões, para elas mobilizando e nelas esgotando a sua capacidade de análise e de crítica

E, no entanto, ontem mesmo, se discutiram, em Lisboa, temas tão próximos e actuais como a “desintermediação” da comunicação política, através da utilização das redes sociais nas campanhas eleitorais (incluindo a análise do caso do Presidente-candidato Cavaco Silva, numa sessão que contou com a presença do seu mandatário para a Sociedade da Informação, e se analisaram comparativamente os casos inglês e americano, de utilização das redes nas últimas campanhas eleitorais); o papel dos programas de entretenimento na discussão de políticas públicas, o comentário político, entre outros temas de  inquestionável interesse para os profissionais dos média.

O curioso é que os jornais, as rádios e as televisões frequentemente relatam resultados de estudos e trabalhos de investigação sobre várias matérias. Mas se seguirmos essas notícias verificamos que elas não resultam, em geral, de um trabalho elaborado pelas redacções com base no acompanhamento desses estudos mas sim de resultados que lhes são apresentados em forma final pelas fontes que promovem esses trabalhos. As redacções limitam-se a fazer uns títulos, ouvir os autores e preparar uns quadros.  

E temos assim que  tudo o que requeira algum “trabalho de casa”, implique acompanhamento,  discussão de resultados, confronto de pontos de vista, análise e crítica fundamentadas, não tem qualquer chance de cobertura jornalística, sobretudo se o que estiver em discussão forem os próprios média.  

As consequências de uma  visão tão redutora sobre o “campo” dos média como aquela que resulta da leitura das páginas “especializadas” só pode empobrecer o próprio “campo”, os seus profissionais e os leitores.  

 

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