Não é preciso ser economista, financeiro ou gestor para saber que quando se pretende vender um bem, seja uma empresa, uma mercadoria, ou qualquer outro, o que é normal é que se tente valorizá-lo o mais possível. Quando, ao contrário, quem vai vender um bem em vez de o valorizar o desqualifica publicamente, três hipóteses são possíveis: ou não precisa do dinheiro que vai arrecadar com a venda, ou pretende favorecer um comprador que tem em mente retirando da operação outro tipo de proveitos, ou é um “negociante” incompetente.
Este raciocínio aplica-se que nem uma luva ao que está a acontecer com a anunciada privatização da RTP, a crer nas declarações vindas a público dos vários intervenientes no processo.
Senão vejamos:
– Numa primeira fase, apresentou-se a RTP como uma empresa endividada, gastadora, com pessoal a mais, cheia de vícios, vencimentos de luxo, etc., etc., isto é, arrasou-se a imagem da empresa;
– Depois, criou-se um “grupo de reflexão” para decidir o que é o serviço público, ao mesmo tempo que se encarregou a empresa de preparar a reestruturação tendo em vista a privatização de um dos seus canais generalistas de televisão e um ou dois canais de rádio. Isto é, o “grupo de reflexão” foi reduzido à mais absoluta insignificância;
– Apesar disso, o “grupo” continuou a reflectir enquanto a administração da empresa finalizava o plano de reestruturação e o fazia aprovar pelo ministro da tutela;
– Divulgado o plano, ficou a saber-se que o “novo canal” usará as instalações da RTP e partilhará com ela os serviços de produção e distribuição, pondo o carro à frente dos bois;
– Ficou também a saber-se que após a privatização de um canal a RTP terá seis minutos de publicidade por hora e espera conseguir angariar 30 milhões de euros anuais de receitas publicitárias;
– Confrontados com este anúncio, os operadores privados entraram em pânico e Pinto Balsemão aproveitou a conferência sobre “Media do Futuro” para dizer que o governo quer acabar com eles, mas se não quer parece;
– Perante as reacções desfavoráveis, o ministro da tutela diz “que “não faz sentido” falar sobre essa matéria, uma vez que “o modelo de alienação do canal ainda não está definido“;
– Baralhados com tanta contradição, os jornalistas perguntaram aos presidentes da Portugal Telecom, Zon e Vodafone Portugal se estão interessados na privatização do canal da RTP, tendo estes garantido que não;
– Mais baralhados ainda, os jornalistas perguntaram ao ministro da tutela se haveria interessados no canal a ser alienado, ao que o ministro da tutela respondeu com uma pergunta: “O que é que os senhores acham?”;
– Entrevistado na TVI por Judite de Sousa, o ministro da tutela não desfez as contradições mas, pela primeira vez, elogiou os trabalhadores e disse que a RTP é “uma grande televisao” que até “faz parte do nosso imaginário”;
– Na mesma entrevista, meio zangado, disse às privadas que seguissem o exemplo da RTP na contenção das despesas.
Conclusão:
Depois do arraso a que a sujeitou, talvez constatando que foi longe demais, o “vendedor”, isto é, o ministro da tutela, achou melhor começar a elogiá-la.
A mal-amada RTP deve andar pelo “preço da chuva”.
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A estratégia de Miguel Relvas é clara, sendo fácil adivinhar quem é o seu comprador favorito para a RTP.
Mas convenhamos que a mesma RTP se tem posto a jeito para os defensores da privatização. Basta pensar na mediocidade de muita da informação que nos presta-muitas vazes ao nível de qualquer tabloide-na falta de pluralismo, na má qualidade de muitos jornalistas,de reporteres incapazes de alinhar meia dúzia de frases,dos atropelos a lingua portuguesa, no esacandalo das “férias de alguns correspondentes,
Por isso não se admirem que quem é contra a existencia de uma Televisão pública explore até ao limite todas essas fragilidades