RTP: o braço de ferro

RTP prédioO braço de ferro  entre o Conselho Geral Independente (CGI)  e a administração (CA)  da RTP é a todos os títulos deplorável e produz graves prejuízos na reputação da RTP e dos seus órgãos. As posições públicas do CGI e do CA criaram uma situação cuja solução, qualquer que ela seja, deixará mal ambas as partes.

Como se não bastasse, as declarações sucessivas do governo, primeiro, do ministro da Presidência, Marques Guedes, e depois do  ministro da tutela, Poiares Maduro, secundadas pelas do primeiro-ministro, conferem uma dimensão política a um conflito que deveria manter-se no âmbito da empresa,  com a agravante de colarem o CGI às suas posições, contribuindo para a percepção de que o CGI foi,  neste conflito, influenciado pelas posições do governo.

A tudo isto se juntou a posição dos  cinco directores de informação e de programas dos canais de televisão e de rádio do grupo RTP, de pedirem  à ERC  -Entidade Reguladora para a Comunicação Social –  que esclareça “se o Conselho Geral Independente (CGI)tem  ou não competência para interferir na escolha de conteúdos editoriais como os direitos de transmissão da Liga dos Campeões”, acusando este órgão de “violação grave da autonomia editorial”.

Caberá à ERC pronunciar-se sobre essa matéria e não se imagina o que acontecerá se esta concluir que os jogos da Liga, sendo embora um conteúdo estratégico, como aliás muitos outros, são na fase de operacionalização em que se encontram, matéria da exclusiva competência dos directores de conteúdos.

Por outro lado, levanta-se a questão de saber se compete ao CGI a aprovação pontual de conteúdos programados pelas direcções de conteúdos da empresa, como é o caso, uma vez que o CGI não questionou, ao que se sabe, quaisquer outros eventos, igualmente de natureza estratégica, programados pela RTP para os próximos meses.

A anunciada destituição da RTP necessitará, pois, a meu ver, de melhor enquadramento jurídico, uma vez que “a falta de lealdade” invocada pelo CGI não consta do art.º 23.º dos Estatutos da empresa, no qual se definem as condições em que a Assembleia Geral (cujo accionista único é o governo) pode destituir o CA (sem ter que o indemnizar).

É muito óbvio que o governo quer substituir a administração da RTP mas não teve coragem de o fazer no momento em que criou o novo órgão a quem conferiu poderes de nomear, supervisionar e destituir o CA. Nessa altura teria sido lógico, uma vez que alterou o quadro legal e institucional em que a nomeou,  mas o governo fugiu à inevitável indemnização a que o CA  teria direito.

A absurda situação de obrigar o actual CA a apresentar um plano estratégico (PR) ao CGI para meia dúzia de meses sem que este tenha produzido as linhas orientadoras que considera deverem nortear a elaboração do PE e sem que o novo contrato de concessão tenha entrado em vigor, só podia dar no que deu. O CA limitou-se a elaborar um PE baseado no PDR em vigor, aprovado pelo governo.

A perturbação vivida pela empresa não resulta em si mesma, a meu ver, da existência do novo órgão mas sim da maneira atabalhoada e apressada com que foi criado, quase no final do mandato do conselho de administração, cuja posição se viu  subalternizada por um órgão que passou a ditar-lhe orientações e a supervisionar o plano  estratégico da empresa.

Teria sido avisado que o CGI tivesse iniciado funções com um novo CA, sem “disposições transitórias” que introduziram incoerência e conflitualidade numa empresa que precisa de tudo menos disso.

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3 respostas a RTP: o braço de ferro

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  2. Carlos Serra diz:

    Isto é que vai uma crise! Agora a ERC atira com um balde de água gelada para cima do CGI (e de caminho gela o Governo).

  3. cristof9 diz:

    Tanto os sindicatos, como todos este des-reguladores na RTP como no país em geral devem ter uma intenção de vacinar os cidadãos com um medo de tudo o que seja publico. E pelos vistos é bem avisado fugir destes imbróglios e empresas em que por ser publico os prejuízos não contam. Um desastre e uma vergonha.

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