Ao recusar sair da cadeia em troca de uma prisão de pulseira no tornozelo, Sócrates fez o que devia fazer. Quem acredita que ele não é um corrupto não compreenderia que mostrasse submissão perante quem o prendeu mas ainda não provou que ele á culpado. Sócrates não podia, a troco de uma meia liberdade, ir para casa curvando-se perante o procurador e o juiz como se estes lhe estivessem a fazer um favor. Este seu gesto de recusa de uma prisão menos violenta do que a actual mostra que ele está seguro de ser vítima de uma injustiça.
O ineditismo da sua atitude mostra coragem. Sócrates não é um preso como qualquer outro. É hipócrita ignorar essa circunstância e olhar para o lado, atirando com o estafado chavão “à justiça o que é da justiça”. Como é hipócrita ver e ouvir nas televisões magistrados do Ministério Público e juízes afirmarem que não falam de processos em concreto, mas depois dão pistas sobre o que dizem ser os interesses dos arguidos e dos seus advogados, afirmando que a defesa fura o segredo de justiça para depois dizer que as fugas vêm da acusação.
Sejamos claros: os políticos ligados ao governo andam com Sócrates debaixo da língua para usarem quando convém. Fazem como os responsáveis pelo processo, que guardam para momentos convenientes coisas que querem que se saiba mas sem se saber de onde vêm.
O PS tenta cumprir a postura definida por António Costa e não falar de Sócrates. Mas é possível perceber que muitos socialistas gostariam de poder dizer o que lhes vai na alma… Porém, o povo, pelo menos alguma parte do povo, não tem papas na língua. Hoje num dos foruns radiofónicos a pergunta era se a libertação de Sócrates prejudicaria o PS. Uma ouvite deu a resposta adequada: “porque é que a libertação de Sócrates havia de prejudicar o PS e as dívidas do primeiro-ministro à Segurança Social e os submarinos de Portas não prejudicam o PSD e o CDS?
O Ministério Público e o juiz de instrução parece não terem percebido que de facto Sócrates, pelo facto de ter sido primeiro-ministro, não é um preso como os outros. Cada decisão da justiça sobre Sócrates é alvo de grande visibilidade e gera paixões e ódios. Se Sócrates fosse um preso como os outros não abria telejornais nem era capa de jornais. Uma vez detido, concentra à porta da prisão microfones, câmaras de televisão e mirones. Quando for libertado os microfones e as câmaras de televisão mudar-se-ão para a rua onde ele estiver.
Preso ou em liberdade Sóctrates sempre perturbará a investigação. Não há solução para isso e a justiça não estava afinal preparada para prender um ex-primeiro-ministro. Mesmo preso Sócrates parece amedrontar o procurador e o juiz. No fundo, no fundo, quiseram testá-lo: se aceitasse a pulseira mostrava fraqueza e meia culpa. Rejeitando-a, como fez, volta para o mesmo castigo até vergar.
Mas Sócrates jamais se calará e quando chegar a acusação saberemos se tinha razão.
concordo com o comentário a 100%
Por vezes assisto aqui a discussões e comentários acalorados sobre o ataque da justiça a José Sócrates. como já devem ter percebido nada disto me surpreende, esta noticia é de 18 de Dezembro de 2010, leiam e entendem imediatamente porque razão Sócrates está preso…Medida de Sócrates: Os magistrados – juízes e procuradores – que residam na área da respectiva comarca vão deixar de receber 775 euros como subsídio de renda. Só os que morarem fora é que manterão tal complemento, mas com um corte de 20%. (Este governo PSD/CDS já aumentou os Juizes e Procuradores em 1300 euros). As férias foram reduzidas para 30 dias como toda a gente. Há ainda outras regalias que também levam corte,mas também os casamentos Gay e legalização do aborto, cortes nas reformas dos políticos, o mexer nas vacas sagradas, criaram muitos anticorpos. http://viriatoapedrada.blogspot.pt/2014/07/a-maior-cabala-e-mentira-depois-de-74.html
Sócrates é o “homem” que Sá de Miranda se sentiu no seu tempo e descreveu nas suas Cartas ou Sátiras dedicadas a El Rei D. João III, em meados do Séc. XVI;
Homem dum só parecer,
dum só rosto e d’ûa fé
d’antes quebrar que volver.
Aquele “homem” de uma honestidade cívica exemplar que o levava a censurar a corrupção do clero, a verberar as injustiças dos magistrados e administradores e ser solidário com os humildes.
E, tal como Sá de Miranda, também Sócrates sendo perseguido e encurralado pelos que denunciava como oportunistas e corruptos e que viviam à sombra e à conta da corte, se serviu das doutrinas filosóficas dos estóicos para sobreviver fazendo do pensamento uma força invencível.
Não concordo com o ponto de vista que só perante o conteúdo da acusação se saiba se Sócrates tem ou não razão; pelos anos que já leva esta constante e persistente perseguição a Sócrates sem, contudo e apesar de um poder discricionário sem controlo, conseguirem provas para sustentar uma acusação ou arremedo dela, é a prova a contrário de que estamos perante uma vingança política corporativa sob disfarce jurídico.