Os comentadores de direita esforçam-se à procura de argumentos para fazerem crer que o resultado eleitoral do PS “está nas mãos de José Sócrates” e dependente de ele “dar ou não dar entrevistas”. Já se percebeu que a direita está mortinha por ouvir Sócrates, não pensa noutra coisa senão em Sócrates e os jornalistas acompanham a “onda” causando nos portugueses uma “indigestão” de Sócrates.
Marques Mendes, na SIC, não se tem cansado de alimentar intrigas sobre um alegado “mau relacionamento” entre Sócrates e António Costa que lhe teria sido confidenciado por “socialistas que visitam Sócrates”. No último sábado afirmou que “considerava o máximo do requinte e do cinismo que José Sócrates falasse na véspera do debate” entre Passos e Costa, acrescentando que “ele é capaz disso”.
Por seu turno, Marcelo Rebelo de Sousa, mais sofisticado e pérfido nos argumentos, expôs na TVI o seguinte raciocínio: se a coligação ganhar, Sócrates vai poder continuar a dizer que o seu processo é um processo político; se o PS ganhar o processo será apenas um processo judicial (como quem diz que Sócrates quer que a direita ganhe).
Trata-se de um tipo de pressão exercida não apenas sobre António Costa e o PS mas sobre os portugueses em geral e também sobre os jornalistas que depois repetem estes argumentos e os transformam em opinião vertida em artigos e colunas de jornais.
No ambiente mediático em que estamos mergulhados, a agenda jornalística é marcada pelas opiniões de comentadores televisivos sobre a performance dos líderes partidários e não pelo discurso e as propostas dos próprios líderes. Ouvimos comentadores defenderem que Costa tem “demasiadas propostas e números” e que Passos Coelho já percebeu que o melhor para si é “fazer-se de morto” e falar o menos possível, coisa que eles elogiam.
Num país em que os jornalistas fossem verdadeiramente autónomos de audiências e de interesses comerciais, não os ouviríamos dizer, como se fosse uma fatalidade, que a vitória do PS “depende de Sócrates” e que “se ele falar” as notícias se centrarão na sua pessoa e não nas propostas do PS e de António Costa. É que um jornalismo a sério não deixa que lhe determinem as prioridades informativas.
De facto, a decisão de privilegiar eventuais declarações de Sócrates sobrepondo-as à discussão sobre as propostas eleitorais para o país é da responsabilidade dos jornalistas e não de José Sócrates. Que os comentadores não percebam este “pequeno detalhe” não se estranha, já que são parte interessada num dos lados. Que os jornalistas se demitam das suas funções é inaceitável.