A meio da tarde começou a ler-se e a ouvir-se que Bruxelas não aceita o orçamento do Estado. Depois, já não era bem assim e Bruxelas tinha dúvidas, depois Bruxelas mandou uma carta ao ministro das Finanças, depois a carta exigia esclarecimentos sobre o défice estrutural.
Para alguns, Bruxelas já tinha chumbado o orçamento. Não faltaram as previsões tenebrosas, as acusações ao laxismo e à pressa do governo em avançar com o alívio da austeridade, o erro da reposição dos salários e pensões e das 35 horas.
O catastrofismo era partilhado por jornalistas e deputados da oposição que logo acorreram a falar de falta de “realismo” (que era uma coisa que o governo anterior cultivava muito, como se viu pela promessa de 35% de reposição da sobretaxa que passou para zero). Tantos, afinal, com saudades da austeridade que, essa sim, garantia o nosso futuro e as boas graças de Bruxelas.
O correspondente da RTP bem explicou que a carta de Bruxelas é uma prática habitual e que Maria Luís Albuquerque também recebeu. E que Bruxelas apenas dá um parecer ao orçamento, pois quem aprova ou rejeita orçamentos dos Estados-Membros é o Eurogrupo e esse só lá para Março é que vai olhar para o orçamento português.
O primeiro-ministro não deixou o spin avolumar a “tragédia” e lá de Portalegre, onde se encontrava num evento público, explicou que a carta de Bruxelas é “absolutamente normal e própria do diálogo que tem vindo a manter com a Comissão Europeia e em que a comissão coloca dúvidas que deseja esclarecer”.
Bruxelas também desmentiu que tivesse rejeitado o orçamento do Estado, mas isso pouco interessa porque como sabemos o importante não é o que acontece mas o que os media dizem que acontece. E assim se criam “factos” e se fazem subir juros e cair ratings e reputações.
Não deixa de ser uma ironia que quem nada disse sobre bancos como o BES e o Banif até eles falirem à frente dos nossos olhos, veja agora chumbos e reprimendas onde apenas há normais pedidos de esclarecimento.