A ver se a gente se entende

Passos no RatoPassos Coelho e Paulo Portas passaram a pré-campanha e a campanha eleitoral a arrasarem o cenário macroeconómico e o programa eleitoral do PS. Passos deu entrevistas antes mesmo da campanha jurando que não faria qualquer acordo pós-eleitoral com o PS. Portas e o seu discípulo predilecto, Nuno Melo, achincalharam quanto puderam António Costa e o PS. Programa de governo da coligação, nem vê-lo. O programa eleitoral era o PEC enviado meses antes para Bruxelas, em que o dado mais relevante é um corte de 600 milhões nas pensões de reforma. Isto é apenas um pequeno resumo do passado recente.

Recuando às legislativas de 2011, Passos candidatou-se com um programa que nunca cumpriu. Todos nos lembramos das promessas de que não cortaria os subsídios de férias e de Natal e depois foi o que se viu. Durante a campanha mentiu com quantos dentes tinha, dizendo que não conhecia o PEC  IV, vindo depois a saber-se que tinha ido a S. Bento chamado por Sócrates para lhe apresentar o dito PEC IV. Depois de ganhar as eleições coligou-se com o CDS sem que alguma vez durante a campanha tivesse anunciado que o iria fazer. Ninguém pôs em causa essa coligação, nem aliás tinha que pôr.

António Costa é agora acusado de não ter dito que podia aliar-se  à esquerda e até Durão Barroso vem fazer de porta-voz dos “eleitores socialistas” dizer que os socialistas não votaram para terem um governo apoiado pelo PCP e pelo Bloco. Costa é acusado pelos comentadores da direita de querer ser primeiro-ministro sem ter ganho as eleições só para “salvar a pele”, depois de as ter perdido.

Vejamos então:

António Costa sempre afirmou, desde que chegou à liderança do PS, que não se aliaria à direita, tendo durante a campanha afirmado que não viabilizaria um orçamento de um governo da coligação que mantivesse o rumo da austeridade, o que causou grande alarido e reacções violentas de Passos, Portas e seus comentadores. Criou uma equipa, concebeu um programa alternativo quantificado e calendarizado, submeteu-o a discussão pública, chegou à campanha eleitoral com o trabalho de casa feito, uma equipa renovada e de competência à prova de bala.

Falhou em não ter contratado um marketeiro, de preferência brasileiro, que o treinasse em sound bites, mentiras, pose de artista de variedades, lhe colocasse a voz e lhe aperfeiçoasse a dicção. Perdeu as eleições, embora ganhando votos e deputados relativamente a 2011. Na noite da derrota, verificando a posição charneira em que os resultados colocaram o PS,  manteve o discurso de que não viabilizaria um governo que contrariasse o essencial do programa do PS e preparou-se para o diálogo à esquerda e à direita.

O Presidente da República fez o resto: chamou Passos Coelho encarregando-o de resolver a questão do governo, sem dar  cavaco ao PS. António Costa não ficou à espera e, uma vez mais, fez o que disse que faria: dialogar com o PCP e o Bloco. Não sei se esperava ter acolhimento destes dois partidos mas o certo é que o teve.

Entretanto, Passos e Portas chamaram Costa para trocarem ideias. Apareceram de mãos vazias. Costa esperava mais e pediu uma proposta concreta. Que chegou ontem. Hoje a coligação foi ao Rato discutir a proposta e ouviu de Costa que ela é insuficiente e não responde a nenhum dos desafios de que o país precisa para mudar de rumo. E Costa prometeu que lhes enviaria por escrito as críticas que a proposta lhe merece, para que não digam que não sabiam. Depois voltarão a conversar.

Passos e Portas saíram da reunião a repetirem que ganharam as eleições e querem governar. Pois que governem, se forem capazes de o fazer sozinhos ou se conseguirem apoio do  PS. Mas, para isso, façam um programa decente e não uma colagem de medidas avulsas do programa do PS, como o que apresentaram agora. É que o programa do PS integra-se num cenário macroeconómico em que cada uma das medidas possui uma coerência e uma função que a relacionam com outras medidas do cenário.

A coligação precisa de perceber que o facto de ter ganho as eleições sem maioria a obriga a encontrar soluções para poder governar e, se não conseguir, tem de assumir esse facto sem se vitimizar. A vida continuará porque em democracia há sempre soluções.

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11 respostas a A ver se a gente se entende

  1. MANUEL Pernes diz:

    Ou é desmiolado ou é totalmente desmioladoa quando acusa um governo que recebe um país refem dos credores para não entrar em bancarrota de facto, de não cumprir um programa eleitoral. Esta a querer enganar quem? Percebe a figura que faz ao tomar todos por burros? Infelizmente muitos têm memória curta e deixam passar a hipocrisia do seu palavreado. Não nos podemos esquecer que o partido de que se auto-assume como “porta voz free lancer “ nos levou todos a pagar uma factura brutal por nos levar à falência. Ou há outra maneira de ver a realidade?

  2. celeste martins diz:

    Nem mais ! Ora ai está o que a gente vê, ouve e lê…. “Sofia deu-nos o mote” ! Não precisamos ser indefetíveis dum campo para sermos objetivos e honestos ! Perante a realidade e a sucessão de acontecimentos não vale a pena fingir ! Os votos do PS em particular e da esquerda em geral não são senão a vontade de não sustentar a direita no poder ! Há “pitonisas” a interpretar o que a maioria do povo quer…desde que invertam o seu significado ! Ah! quanto não daria a direita por uma ditadurazinha, nem que fosse de 6 meses? Esta semana deu para ver as “garras” da direita “civilizada” …antes disfarçadas numa maioria.

  3. VALEU A PENA?
    Corte de pensões;
    Brutal aumento de impostos;
    Degradação dos serviços públicos;
    Cortes nos apoios sociais;
    Cortes de salários;
    Privatizações;

    Aumento da dívida pública;
    Dívida em 2011 – 184.699 mil milhões
    Dívida em 2015 – 290.000 mil milhões
    Défice em 2011 – 7,4%
    Défice em 2014 – 7,2%

    SE OS QUE EMIGRARAM CÁ TIVESSEM FICADO, O DESEMPREGO REAL SERIA, SEGUNDO O CENTRO DE ESTUDOS SOCIAIS DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA, DE 29%.

    As Contas do Desemprego – 2015
    (Mas sem “Tretas”)
    620.400 – desempregados oficiais
    +242.900 desencorajados
    +242.800 subempregados
    +158.000 ocupados IEFP
    + 450.000 emigrados
    1. 714. 100 Desempregados reais 29%.

    Governo Passos/Portas
    Recuámos
    10 anos na riqueza produzida
    20 anos no emprego
    30 anos no investimento
    40 na emigração.

    http://viriatoapedrada.blogspot.pt/2015/09/comparando-governo-de-socrates-e-passos.htmlhttp://viriatoapedrada.blogspot.pt/2015/10/as-mentiras-de-passos-coelho.html

  4. Rui Marques diz:

    Sou leigo na matéria mas creio que devia ser feito uma auditoria as contas públicas afim de se saber o que deve ou não ser feito quanto a Passos e a Portas mentirosos sim mentiram pondo em causa muitas família
    Bem como ainda só tinha dois anos quando se deu o 25 de Abril vou dizer de boca cheia que só se deu porque foi o Exército que o fez não o povo o povo entrou porque lá estava o Exército porque senão ainda esta vamos com o mesmo regime de há 41 anos atrás.

  5. Pingback: A ver se a gente se entende

  6. Respondi-lhe por email, dado que não publico insultos. Se souber discutir ideias publicá-las-ei. Este blog não é um caixote do lixo.

  7. Miguel Seabra diz:

    Sem me surpreender, vejo que apagou o meu post. Não posso acrescentar nada, a tão esclarecedor argumento. Obrigado. Cumprimentos.

  8. Obrigada, Miguel Seabra, pela leitura atenta do meu blog. De facto, a coerência é total. Falta contudo nos excertos o enquadramento em que se insere cada um deles.

  9. Miguel Seabra diz:

    Minha cara senhora, felicito-a pela sua coerência.

    27 de Maio de 2014, após a vitória do PS nas europeias:
    «Não sei se o PS está consciente de que necessita de um líder capaz de em 2015 arrasar pelo voto uma coligação desastrosa que levou o País à pobreza e à desesperança. O tempo escasseia e no domingo passado foi perdida uma oportunidade histórica de o conseguir. O “aparelho” do PS está contente com a vitória alcançada? Triste contentamento, triste consolo. O PS precisa de mais ambição. António Costa, se for ele a “chegar-se à frente”, não pode recuar outra vez.»

    19 de Junho de 2014, a favor da mudança de líder no PS:
    «Não se compreende que perante os magros resultados obtidos pelo PS nas eleições europeias, perante a insatisfação manifestada pelos portugueses face aos partidos e aos actuais dirigentes políticos, incluindo o PS, António José Seguro não tenha percebido a mensagem e assumido que os portugueses pedem mudança, não apenas no governo mas também na oposição e, desde logo, no PS.»

    5 de Outubro de 2015, após a derrota do PS nas legislativas:
    «António Costa perdeu esta eleição. É um facto, e o seu maior erro foi ter pensado que o País estaria interessado em ter, pela primeira vez, um programa eleitoral quantificado, transparente e credível.»

    5 de Outubro de 2015, contra a mudança de líder no PS:
    «O PS tem, de facto, uma reflexão a fazer. Desde logo, reforçar a autoridade de António Costa para que ele e o partido possam encarar os difíceis desafios que têm pela frente. Embrenharem-se agora em lutas internas de ajustes de contas representará um verdadeiro haraquiri para o PS e para quem enveredar por esse caminho.»

  10. jpferra diz:

    Mais a mais os PAF podem sempre arranjar acordos com o bloco ou o pcp…

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