Olhar o país e o mundo a partir de um quarto de hospital, acompanhando um ente querido, ensina a relativizar as coisas e a perceber que o que antes parecia importante e prioritário é capaz de não ser mais do que um momento fugaz que a espuma dos dias e o ruído mediático farão desaparecer substituindo-o por outro e outros que, por sua vez, se transformarão em novos momentos igualmente breves e fugazes.
A pequena televisão no quarto é a ligação possível com o mundo exterior a quebrar a monotonia das batas brancas e verdes que entram e saem ao ritmo das rotinas estabelecidas. No quarto do hospital o mundo fica lá longe e as notícias tornam-se banais, quase insignificantes.
No quarto do hospital descobre-se que afinal podemos parar o mundo como se ele não existisse, como se as imagens que passam no pequeno écran a que tirámos o som fossem de um outro mundo a que já pertencemos mas que deixou de interessar, simplesmente porque nada mais existe para além das fronteiras do quarto do hospital.
Há um lado egoísta neste sentimento de que nada é mais importante do que a nossa dor, ela sim insignificante perante desgraças como as centenas de refugiados que morrem cada dia tentando fugir da guerra, da miséria e da morte.
Mas há também um lado criador no sofrimento, que nos faz descobrir ou conhecer melhor o pequeno mundo em que a dor nos encerra. Observar de perto o dia a dia de um hospital é uma experiência dolorosa mas enriquecedora. Podemos então perceber melhor o que está em causa quando fazemos opções políticas e queremos escolher o modelo de sociedade que melhor acautele os direitos e a dignidade a que todos os seres humanos têm direito. Percebemos aí a importância do estado social e a relevância de o desenvolver e melhorar. E percebemos que temos ainda um caminho a percorrer.
No quarto do hospital os grandes assuntos do momento esfumam-se no silêncio e na meditação, como uma nesga de luz perdida na escuridão. A vida e a morte, o sofrimento e a angústia, a esperança e o desânimo ocupam o espaço e o tempo. O mundo fica lá fora, ausente das imagens que povoam as nossas cabeças….
(Post dedicado aos amigos que perguntaram por mim)
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Muito obrigada!
Não me posso considerar seu amigo. Nem do peito nem de perto. Mas sou um assíduo leitor e admirador dos seus textos. Por isso ter dado pela sua falta e ter ficado preocupado quando soube que metia hospital. Todavia, ao saber que tinha lá estado somente como acompanhante, descansei. E ainda bem que assim é, pois poderei continuar a ter o prazer de ler os seus textos. Uns mais oportunos e contundentes que outros, mas todos sempre com interesse de leitura. . Carlos Patrício Álvares (Chaubet)
Não posso ter pretensões para dizer que sou seu amigo. Mas posso dizer que é uma pessoa que, pelo que escreve e pela forma como o faz, simpatizo. Assim,. ainda bem que reapareceu.E que a sua passagem pelo hospital, tenha resolvido completamente o problema que a levou lá. Com consideração e respeito Carlos Patrício Álvares (Chaubet)
As melhoras e regresse `depressa1
diariamente abria o vai e vem e nada…nada para ler, para pensar… achei estranho. Afinal está tudo explicado. as melhoras ao familiar. Uma quase Elvense preocupada.
tenho andado por fora,e por isso deixei de a ler. bem -vinda a beirais,desculpe ao “vai e bem.”.gosto de a ler. identifico-me ,com a sua maneira de estar na vida.simples, solidaria e da esquerda democratica. muita saúde para si e para os seus.
Caro Manuel Pacheco, obrigada pelas suas palavras. Apenas uma rectificação:acompanho um familiar hospitalizado.
Duvidava de algo. Mas nunca pensei que estivesse internada num hospital. Ali dá-nos para pensar em tudo. Infelizmente já passei vários dias por várias vezes que estive internado. Umas vezes na Ordem Carmo, no Porto e outras no I.P.O. também no Porto. As horas e dias nunca mais passam. E a sensação que se tem quando de é levado para a sala de operações. É aterrador.
http://coisasquepodemacontecer.blogspot.pt/2010/08/coisas-do-dia-dia_9121.html
Belissimo texto sobre uma crua realidade: “No quarto do hospital o mundo fica lá longe …”
Tinha saudades de a ler……….